Conto - A Síndrome do Impostor
- Srta. May
- 30 de set.
- 3 min de leitura

Oi amigs. Eu tava precisando atualizar o blog, né?
Eu comecei a frequentar uma oficina de escrita criativa há alguns meses e um dos desafios das aulas é escrever todos os dias. Esse conto é resultado de um desses exercícios diários.
A Síndrome do Impostor
por Mayara Martins
"Eu sou um escritor! Eu sou um escritor! Eu sou um escritor” — murmurava ele, ao fitar seu reflexo no espelho.
As palavras repetiam-se, ganhando vida na boca seca. Os olhos no vidro eram de um homem cansado, e havia uma dúvida — uma vozinha que sussurrava de dentro, cheia de veneno:
“Você não passa de um impostor.”
Ele apertava os punhos, tentando afogar a voz. Precisava se convencer, precisava acreditar. Mas o silêncio do quarto pequeno o afogava em pensamentos.
O escritor tremia. Necessitava desesperadamente de uma bebida, de algo que pudesse calar seus pensamentos auto sabotadores, sua síndrome do impostor que se negava a abandoná-lo.
A síndrome do impostor é algo terrível.
É como uma sombra invisível que corrói a alma, um veneno que sussurra no silêncio da mente, dizendo que você não merece nada do que conquistou e que, no fundo, não é ninguém.
E quanto mais você tenta provar que é real, mais ela aperta seu peito — uma pressão sufocante que rasteja como um veneno gelado, lembrando que a verdade está ali, tão perto e ao mesmo tempo tão longe, escondida nas sombras que você tenta ignorar.
A voz se enroscava nos seus pensamentos como uma serpente silenciosa, apertando, esmagando a sanidade que ainda restava.
Mas ele precisava se agarrar a algo — qualquer coisa que dissesse que ele era mesmo um escritor.
O quarto estava vazio, salvo pelos papéis amassados jogados por todo o chão, com palavras que não pareciam suas.
“Quando vou sentir que mereço? Quando vou ser bom o bastante? Quando você vai me deixar em paz?” murmurou o escritor, a voz trêmula, quase um pedido.
“Você acha que um dia vai merecer?” A resposta veio em uma gargalhada gélida, cortante como uma lâmina que roça a pele, fazendo-o arrepiar até os ossos. “Você não é bom o bastante. Nunca foi. Você é um impostor. Nunca escreveu nada de proveitoso. E nunca escreverá.”
O escritor fechou os olhos, tentou respirar fundo — mas o ar queimava em seu peito.
“Será que estou enlouquecendo?”
“Ah, sim. Você enlouqueceu há muito tempo. Por isso estou aqui. Sou sua consciência — se é que você ainda tem uma.”
A voz não descansava. Não se calava.
O espelho refletia uma sombra atrás dele, uma figura indistinta. Ele piscou. Não havia ninguém — nada. Só o silêncio, pesado, esmagador.
“E COMO POSSO TE FAZER IR EMBORA?” Gritou, a voz rasgando a noite do quarto, desesperada, quase quebrando.
“Quando você vai admitir?” A resposta veio num sussurro perto do seu ouvido, um hálito frio, um toque fantasmagórico que gelava a alma.
O escritor riu — um riso louco, sem controle, que ecoou pelas paredes nuas.
“Será que é assim que todo escritor se sente? Sendo um impostor de si mesmo e de suas ideias? Será que isso é parte em ser um escritor?”
A voz riu ainda mais alto, zombeteira.
O vulto, no chão, atrás do escritor parecia se tornar mais nítido a cada segundo, se desenhando em formas grotescas.
“Você realmente acha que é como os outros? Que pode se comparar a Poe, Tartt ou Christie?” provocou a voz, gotejando escárnio. “Acha que o mestre Edgar Allan Poe seria um medíocre como você?”
O olhar do escritor tornou-se vazio, perdido nas brumas de sua própria loucura.
A sombra no chão do quarto se revelou: um corpo estirado, imóvel, olhos vidrados encarando o nada, uma expressão de medo congelada em sua face. O sangue escorria, manchando o tapete branco.
As mãos do morto ainda seguravam firmemente os papéis que lutou para salvar do falso amigo que as tentou roubar - suas histórias, suas preciosas palavras, frutos de anos de pesquisa e trabalho árduo, agora tingidas de rubro.
“Eu sou um escritor...” sussurrou o homem, a voz falhando, tremendo ao olhar para as próprias mãos - uma delas manchada pelo brilho frio do punhal prateado que agora era vermelho.
"Escritor? Não. Você sempre foi o assassino das ideias - e dos donos delas."
Um sorriso torto, resignado, se formou no rosto pálido.
“Eu sou um impostor.”
PREMISSA:
E se...
Um escritor, com síndrome do impostor, fosse realmente um impostor?
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